26/07
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Terça-feira
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Dar es Salaam - Zanzibar
Hoje viemos para a ilha de Zanzibar (nome oficial Ugunja) uma das duas ilhas grandes que compõe o arquipélago de Zanzibar. Zanzibar era um sultanato controlado por Oman, e hoje é um território semi-independente da Tanzânia: tem seu próprio governo, mas algumas funções, como relações externas, são conduzidos pela Tanzânia.
Pode-se chegar a Zanzibar por avião, barco rápido, ou balsa (no caso de veículos). Nossa opção foi o barco: as motos ficaram no hotel, sob guarda do Julian, e nós atravessamos com uma pequena bagagem de mão para passar duas noites aqui.
Essa travessia é meio surreal: primeiro fomos de taxi até o terminal de embarque, enfrentando relativamente pouco trânsito. E passamos ao longo de verdadeiras mansões na avenida que margeia a costa (parte é praia, mas mais da metade é costa rochosa ao norte e porto mais ao sul). Há muita gente rica nessa cidade!
Chegando ao terminal enfrentamos a enorme bagunça a que já estamos acostumados em muitos lugares da América Latina, com gente empurrando e tentando furar a fila, atravessadores de câmbio, passagens, taxi e seja lá o que mais houver para se negociar. E, já que Zanzibar é uma entidade semi-autônoma, temos que mostrar passaporte para embarcar. E também passamos por detector de metais e a bagagem por raio-X, bem no estilo aeroporto. O único detalhe é que quando alguém esquecia de remover algo metálico e o detector disparava, não havia ninguém para controlar ou fazer o passageiro voltar. Ridículo!
E aqui em Dar es Salaam encontramos pela primeira vez vendedores de castanha do caju, torrada com e sem sal, bem no estilo brasileiro. E castanha do caju não é a única fruta que 'reconhecemos': desde o Malawi temos visto grande quantidade de mangueiras, e por aqui elas foram completadas com melancia, bananas (inclusive da terra e maçã), mexiricas. abacates, maracujá e outras. Em matéria de frutas dá quase prá gente se sentir em casa por aqui. Ah, e ao longo do litoral em Dar es Salaam muitos coqueiros - e vendedores de coco por todo lado.
Especificamente na Tanzânia, tanto as frutas (melancia, manga) como ovos têm uma característica curiosa: as cores são extremamente pálidas. Não sabemos o por quê disso, mas pela quantidade de produtos com essa característica ficamos imaginando se pode haver alguma característica no solo que explique isso.
Uma vez embarcados, em Business Class, poltronas bastante confortáveis, recebemos formulários de imigração para serem preenchidos, formulários da Tanzânia para entrar em Zanzibar. Ou seja, Zanzibar é independente mas aceita o uso de documentos oficiais na Tanzânia. Esse pessoal tem que inventar alguma coisa para complicar a vida das pessoas e tentar vender facilidades - estamos em casa!
Um detalhe que surpreendeu no início da viagem foi a transmissão, pelo sistema de som e vídeo do ferry, de uma oração pela segurança da viagem. Foi a indicação mais clara até o momento de como chegamos a um ambiente marcadamente muçulmano.
E durante a viagem caiu uma nova pancada de chuva! Quase no mesmo horário que ontem: será que esse é o horário da chuva diária nessa região?
Chegados a Zanzibar tivemos que passar por controle de aduana (alguns passaram direto, nós tivemos que abrir a mala) e finalmente estávamos liberados. Havia um guia e um ônibus esperando por nós. Deixamos a bagagem no ônibus e iniciamos uma tour a pé pela Stone Town ou Stone City, o centro histórico de Zanzibarf City, capital de Zanzibar.
Logo de cara fomos apresentados a uma informação nova: um dos cidadãos ilustres nascidos em Zanzibar chamava-se Freddie Mercury. Ao lado do terminal do ferry há um bar/restaurante com seu nome (Mercury) e cheio de imagens e outras referências ao famoso cantor.
Stone Town é patrimôniio da humanidade da Unesco, mas isso não a torna menos pobre e suja: com exceção de algumas propriedades particulares, principalmente hotéis, o resto é muito, muito maltratado. O museu que fomos visitar dá pena, o prédio parece que vai cair de tão mal cuidado, e algumas peças do acervo ficam simplesmente jogadas num canto esperando sabe-se lá pelo quê.
E praticamente não existem ruas: são vielas tortas e desalinhadas, onde não cabe um carro mas circulam motos e scooters sem a menor cerimônia, obrigando os pedrestres a se espremerem nas laterais para deixá-los passar. Zanzibar tem uma história que alterna e mistura influência árabe (Oman), hindú e cristã (ingleses) e isso fica visível em detalhes arquitetônicos: construções em estilo indiano (com varandas) e árabe (sem varandas).
Também as portas demonstram essa diferença. Aliás as portas são um capítulo à parte: ao longo dessas vielas da Stone Town encontra-se dezenas (centenas?) de portas duplas, maciças e lavradas, peças maravilhosas de trabalho em madeira. E atrás delas vendinhas, depósitos e outros negócios extremamente decadentes. Algum dia houve muita riqueza aqui, mas hoje só sobraram as portas...
Falando em árabes, desde o Malawi vemos crescer constantemente a influência árabe e a religião muçulmana. No Malawi aproximadamente 20% da população é muçulmana, na Tanzânia varia muito por região. Quando entramos a influência não parecia tão grande, em Morogoro já percebemos muita gente em trajes típicos, e Dar es Salaam tem 65% de muçulmanos. E agora, em Zanzibar, chegamos a 90%. Definitivamente estamos nos aproximando do Oriente Médio.
Aliás, viajamos por essas estradas sem atentar muito para como estamos avançando pelo mapa. Hoje, tentando entender melhor porque aqui está tão mais quente que em Botswana é que atentamos para o fato de que estamos a apenas 5,7 graus ao sul do Equador! Pretoria fica ao sul do Trópico de Capricórnio, que passa perto de São Paulo, e agora estamos numa latitude que equivale mais ou menos a Maceió. Em linha reta seriam uns 3.000 km, mas já andamos mais de 4.500 para chegar até aqui!
Voltando ao passeio, o ponto alto dele foi, sem dúvida nenhuma, o almoço num restaurante típico árabe - apesar de acharmos que os pratos servidos tinham relativamente pouco a ver com essa cultura. É um terraço aberto, no quarto piso de uma casa, graças a isso muito ventilado e agradável. Tivemos que tirar os sapatos e sentar am almofadas no chão, além de ter as mãos lavadas em estilo árabe.
A comida estava saborosa e foi acompanhada de sorbet de sobremesa, que nos atraiu pelas frutas usadas: maracujá, manga e abacate! Finalmente um lugar fora do Brasil onde abacate é usado para preparar alguma coisa doce. Ainda não conseguimos descobrir se além do sorvete eles também comem a fruta como sobremesa. E para completar um café com especiarias. Bem, nós descreveríamos como uma bebida escura com gosto de uma mistura de gengibre, cardamomo e mais alguma coisa menos identificável. Mas certamente o único gosto que não se sentia era de café...
Depois do almoço ainda andamos mais pela Stone Town, mas infelizmente temos que dizer que a experiência foi mais negativa que positiva: pouca coisa bonita e algumas próximas do repulsivo, como o mercado de peixe e carnes, com paredes e chão imundos, moscas pousadas sobre os produtos e gatos por toda parte comendo restos atirados pelos comerciantes. Ainda passamos pela casa onde Freddie Mercury nasceu, com o nome de Farok Bulsara, filho de pais de origem persa que viviam na India e emigraram para Zanzibar.
Ao fim do passeio, já umas 17h00, voltamos para o ônbus, que nos trouxe, numa viagem de aproximadamente uma hora e meia, para o hotel onde passaremos duas noites. Vir para este hotel também é uma experiência estranha: a estrada passa por inúmeros vilarejos, todos muito pobres, e finalmente atravessamos uma pequena cidade, Nungwi. Essa cidade praticamente não tem ruas pavimentadas, e o caminho para o hotel passa por ruas muito esburacadas e ladeadas por pobreza.
E aí passa-se por um portão, e de repente estamos no primeiro mundo. Esse contraste é muito violento aqui, mais ainda que no Brasil. A costa toda nessa região de Nungwi é dominada por hotéis e resorts, formando um polo turístico economicamente muito importante para Zanzibar.
Nosso quarto é bastante simples, mas fica diretamente na beira da praia, banhada pelo oceano Índico, verde esmeralda. Muito bonito!
27/07
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Quarta-feira
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Zanzibar (Nungwi)
Dia total de descanso! Não fizemos absolutamente nada além de passear um pouco na praia e atualizar estas páginas até este ponto. Agora são 18h15, e vamos sair para tentar fazer algumas fotos bonitas do por do sol.
Almoço foi uma bela lagosta (não muito grande mas gostosa)! Amanhã será o primeiro dos dois últimos dias de motocada. Passou muito depressa!
Temos observado uma diferença bem marcante no uso da língua inglesa desde que entramos na Tanzânia: apesar de continuar sendo a língua básica para negócios e não termos problemas de comunicação nos ambientes turísticos em que circulamos, é nítido que a população em geral usa swahili (também chamada de kiswahili). Mesmo placas de sinalização rodoviária ou cartazes de propaganda muitas vezes são escritos somente em swahili.
Segundo informações que colhemos de fontes que acreditamos confiáveis mas não oficiais, ao se tornar independente, o primeiro presidente da Tanzânia conseguiu fazer com que swahili fosse assumida como língua oficial do país, ao lado do inglês.
Dessa forma, ao contrário de outros países que visitamos mais ao sul, a Tanzânia encontrou uma forma de estabelecer uma língua comum não-européia para viabilizar a comunicação entre as diferentes etnias do país, que usam um total de 124 diferentes línguas. Swahili é primariamente uma língua do povo Bantu, mas foi influenciada pelos diversos ciclos coloniais, que levarfam à adoção de diversas palavras alemãs, portuguesas e inglesas.
Notamos inclusive que mesmo no ambiente turístico há um grande número de profissionais cujo inglês é claramente limitado: aprenderam a língua exclusivamente para poder exercer a profissão em hotéis ou restaurantes com frequência internacional, mas não são realmente fluentes.
Em 2015 foi definido que o inglês deixará de ser usado em todos os níveis de ensino do país (continuará sendo ensinado, mas não mais a língua primária como é hoje no ambiente universitário), num esforço de consolidação do swahili.
Essa língua é também usada no Quênia, Uganda, Ruanda, Burundi, Moçambique na República Democrática do Congo. Ficamos imaginando se ela poderá se tornar a língua franca africana, expandindo-se para outros países, de modo a oferecer uma alternativa local ao inglês para fazer a ponte entre as diversas etnias tribais com suas línguas locais.
28/07
/201
6
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Quinta-feira
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Zanzibar (Nungwi) - Bagamoyo
Estamos retomando este diário de bordo depois de um longo silêncio: hoje é dia 18/08 e já estamos em Woking/UK, na casa de nossa filha Karen. Diversas razões contribuíram para esse hiato, algumas aparecerão ao longo do texto.
A volta de Zanzibar para o continente acabou sendo uma retomada da correria: tínhamos que tomar o barco às 9h00, e havia ainda a hora e meia de van do hotel até o terminal. Mais uma vez tivemos que levantar cedo e tomar o café da manhã antecipado que o Derryl negociou com o hotel. Aliás, sem sucesso: quando chegamos ao restaurante não havia nada pronto, e até terminarmos de comer náo haviam conseguido oferecer café.
Não conseguimos precisar o motivo, mas essas tentativas de antecipação de horários simplesmente não funcionam por aqui. Não sabemos se os gerentes não conseguem fazer os funcionários chegarem mais cedo, se estes não conseguem impor a si mesmos um ritmo diferente de trabalho, ou que outra razão possa existir, mas em todas as tentativas de antecipar desejejuns nos hotéis em que ficamos ocorreram falhas bastante grandes.
E até quando tentam ajudar os funcionários não conseguem (às vezes não por culpa daquele que está se esforçando):: estávamos lamentando que não havia café, e uma garçonete prometeu à Beth que conseguiria uma xícara para ela. A promessa, com bastante demora, foi cumprida, mas... Pelo jeito eles não coam o café e fazem o que chamamos no Brasil de café turco: deixam o pó de café decantar. Como essa xícara foi servida às pressas, provavelmente o café ainida não havia decantado, e veio com quase metade de pó de café!
Sentimos um pouco não poder apreciar adequadamente esse e outros cafés, pois em geral o café na Tanzânia se mostrou muito saboroso, claramente superior ao dos outros países por onde passamos.
Mas enfim, com desjejum meio tomado embarcamos no ônibus/van que nos levou de volta a Zanzibar City. Embarque normal no barco, seguido de uma advertência para não levantarmos e distribuição de saquinhos de plástico. E eles foram usados por diversos passageiros: o mar estava bem revolto, e o barco parecia carrinho de montanha russa subindo e descendo as ondas. Um bocado de gente sentiu-se mal, incluindo a Moira, que chegou bem abalada ao continente.
Voltamos de taxi ao hotel e em função do horário (a viagem de bardo durou meia hora mais que na ida devido às condições do mar) decidiu-se almoçar no hotel antes de seguir para Bagamoyo. Comemos, nos vestimos e tocamos para o próximo destino, a apenas 80 km. de distância.
E mais uma vez, levamos duas horas para percorrer os 'apenas 80 km.': boa parte do trajeto foi e área urbana de Dar es Salaam ou subúrbios, e como dois dias antes, simplesmente não conseguíamos avançar.
Essa parada foi basicamente 'técnica': não era possível chegar a Moshi no mesmo dia, então ficamos nesse hotel um pouco ao norte de Dar es Salaam. Lugar muito agradável, sem o luxo do hotel de Dar mas perfeitamente satisfatório. Só pecou pela qualidade da comida, tanto no jantar como no café da manhã no dia seguinte.
Por outro lado fomos recebidos com um copo de suco de hibisco. Muito saboroso! É prática comum aqui na Tanzânia receber os hóspedes, às vezes ainda no estacionamento, com uma bebida.