Quando chegamos a essa ilha veio a principal decepção com esse roteiro invertido: eram 15h30 e a caminhada até o poço do salto é de pelo menos uma hora, portanto entre caminhada e permanência lá são necessárias no mínimo duas horas e meia. Como já estamos (principalmente eu) um pouco lentos, certamente precisaríamos de mais de uma hora para fazer o percurso, e isso significaria retornar no escuro, com riscos apreciáveis. Fomos obrigados a ceder à argumentação do guia e permanecer no acampamento enquanto os outros seguiam para o salto.
O chato é que pelo programa normal isso não teria acontecido: teríamos chegado ao início da trilha mais ou menos às 14h, e teria havido tempo mais que suficiente para fazer a caminhada.
Bem, pelo menos restou o consolo de ter escolhido a operadora certa: ela é uma das duas operadoras que tem o acampamento rústico bem em frente ao salto, na Isla Ratonzito, permitindo uma vista maravilhosa do mesmo. E a fase da lua também criou uma situação muito especial: era lua cheia, o céu estava claro, e a luz era tão forte que era possível ver o salto à noite. Pena que não deu para fotografar, a cena era maravilhosa!
Ah, o acampamento rústico! É rústico para ninguém botar defeito. É uma grande choupana com teto de palha, sem paredes, onde são penduradas até umas vinte redes, suficientemente próximas para qualquer um chutar outro hóspede se se desequilibrar ao deitar ou sair da rede. E para completar as nossas estavam fixadas num caibro de madeira que estava solto, de modo que um movimento em qualquer uma das seis ou sete redes presas a esse caibro era transmitido às demais redes.
Nos dois banheiros havia vasos sanitários, mas a descarga era um balde de água tirada de um tonel na frente das portas, com água do rio. Lavar as mãos ou escovar os dentes, só lá no rio (uns cinquenta metros afastado do acampamento por uma trilha não-plana) ou com a água de sua garrafa de água mineral. Claro que não há eletricidade, e se você tiver esquecido de seguir a enfática recomendação de levar lanterna ficará numa situação complicada, principalmente para ir ao banheiro durante a noite.
Vale a aventura, mas uma noite é mais que suficiente! A grande surpresa foi o jantar: frango assado no espeto acompanhado de pão, salada e arroz, bem temperados e muito bem arrumado em pratos individuais.
Ah, na volta ao acampamento principal uma venezuelana com quem conversamos fez um trocadilho que tentaremos reproduzir aqui (vamos ver...): ela perguntou se sabíamos que havíamos comido pollo enbarazado (frango grávido para quem não sabe). E a explicação diante de nossa cara de ponto de interrogação: o frango foi en vara asado (realmente eles colocam 3-4 frangos num espeto em pé em torno da fogueira) o que pronunciado rapidamente em espanhol soa como enbarazado.
19/04/2011 - Terça-feira: Canaima
O dia começou cedo: o guia queria que levantássemos às 6h para partir às 7h (programa de índio mesmo, apesar de que duvido que quiséssemos dormir mais). O café da manhã foi frutas, suco e laranja, ovos mexidos, arepas e pão com margarina e geléia e café com leite. Novamente ovos e arepas cuidadosamente arrumados em pratos. Realmente surpreendente. E surpreendente também foi a quantidade de cebola nos ovos mexidos: a dieta matinal venezuelana é meio complicada para nós - depois descobrimos que essa forma de preparação dos ovos faz parte do desayuno criollo.
Um venezuelano nos explicou que é realmente comum se comer muito e pesado no café da manhã, e a razão para isso é que em função de atividade profissional, falta de tempo e até mesmo falta de recursos financeiros impedem muitos venezuelanos de almoçar, tornando o desjejum e o jantar as duas grandes refeições do dia.
A volta não foi muito diferente da ida, apenas mais rápida (estávamos descendo o rio e só paramos para atravessar os Rápidos de Mayupa) e um pouco mais fácil de encarar as corredeiras.
Chegamos a Canaima perto da hora do almoço, e fizemos o deslocamento para o acampamento Bernal de lá, que fica na Ilha Anatoly: tivemos que descer da canoa (no rio Carrao), andar uns cinco minutos de caminhão e tomar outra canoa, agora na Laguna de Canaima. Esse trajeto é curtinho (uns dez minutos) mas muito bonito por passar em frente aos quatro saltos que formam a laguna.
Instalados no acampamento tivemos tempo para ir à praia em frente, que tem como destaque a vista do Salto Hacha, diretamente em frente à praia. Almoço, um pequeno descanso, e seguimos para visitar os saltos Sapo, Sapito e Hacha, passeio bonito e agradável, com belíssimas paisagens, parcialmente graças ao fato do Salto Sapo estar quase seco, o que nos permitiu passear sobre as pedras onde normalmente corre a água.
Dia agradável e, descontada a partida do acampamento rústico, sem grandes correrias. Ficamos apenas imaginando como deve ser passar um meio dia nesses acampamentos com chuva. Deve ser bem complicado!
20-21/04/2011 - Quarta e Quinta-feira: Canaima - Ciudad Bolivar
E nesse dia ficou evidente o terceiro problema com a 'compactação' do roteiro criada pela Bernal Tours nos dois primeiros dias: não tínhamos nada para fazer até 13h30, quando deveríamos partir de volta para Ciudad Bolivar.
Como estávamos numa ilha, dependíamos de barco para qualquer deslocamento, e o que foi oferecido nesse sentido foi um barco para nos levar até a vila de Canaima de manhã. Mas praticamente a única coisa que a vila oferece são lojas de souvenirs - muito longe de nossos interesses.
Ficamos então matando tempo no acampamento, e depois do almoço repetimos o caminho de segunda-feira, no sentido contrário. Tivemos sorte de sermos embarcados no primeiro avião que partiu, e chegando a Ciudad Bolivar nos hospedamos na pousada da família Bernal, lugar simples mas bem arrumado - pelo menos pudemos gozar uma cama confortável e ar condicionado idem.
No dia 21 ficamos praticamente o dia inteiro na pousada, lavando roupa, atualizando o site e planejando os passos seguintes. Já havíamos nos informado que no sábado não seria grande problema ir para Isla Margarita: a balsa estaria vazia e já haveria hotéis disponíveis pois parte dos turistas iniciariam o regresso nesse dia. Decidimos retornar ao plano original e tocar para lá.
Mas também tivemos uma experiência que não deixa de ser marcante num país sobre o qual nos advertem tanto sobre os riscos de roubo: ao sair do hotel para Canaima na segunda-feira, esquecemos o carregador de baterias numa tomada do quarto. Na quarta-feira, ao retornar, fomos ao hotel e o porteiro foi bastante solícito em procurar o carregador, informando inclusive que o quarto não havia sido alugado depois de nossa saída e nos levando até lá para ver se porventura ainda estava no quarto.
Ele não conseguiu contato com a arrumadeira, e pediu que retornássemos no dia seguinte, quando ele teria tido tempo de falar com ela. E no dia seguinte lá estava o carregador, com as duas baterias, a nossa espera. Ficamos nos perguntando em quantos hotéis brasileiros podemos contar com isso.